14.04.08 - 00.01 / 00.14h: Ao Pai

Quarto filho de um proprietário de terrenos e gado de salvaterra do extremo; depois da primária vai para o seminário de alcains por oito anos. Segue para os quatro anos de teologia dentro do castelo de marvão. No último ano, um conflito com o professor de história (por uma visita de raparigas) leva-o para o algarve a mando do bispo de castelo branco e portalegre, futuro bispo do porto. Chega a faro onde entra como aluno, depois professor. É ordenado em dezembro e às quintas (que não há aulas) e domingos vai para a serra do caldeirão numa localidade chamada ameixial - Começou a paixão! Depois, pelo espírito missionário, fica encarregue do "herege" concelho de alcoutim. Sem condições, inicia um trabalho pioneiro: do renascimento religioso à criação do ensino para além do obrigatório (o actual 2º ciclo), que abre portas aos filhos de uma região pobre e analfabeta.


Continuação, dez anos depois, cinco do seu falecimento...


Escreveu ao papa para pedir a saída da igreja porque se tinha apaixonado pela filha da senhora que limpava a casa e tratava da roupa e queria casar; comprou a casa rosa para criar a sua escola no piso térreo onde leccionou até à reforma, cuidou da sogra na sua incapacidade como se da sua mãe se tratasse, continuou a ir à missa onde comungava pela sua própria mão e acolhia todos os sacerdotes que ali chegavam; corria e participava nos comícios pós-revolução como fazia antes com casamentos e baptizados por todas as comunidades onde passava, acrescentou ao prédio o espaço para uma cantina, realizava o transporte escolar com a sua mercedes e ia à vacaria buscar o leite para os meninos lancharem; deixou a sua biblioteca e registo fotográfico (a conservar) como prova da sua avidez de conhecimento para chegar a Deus - Amor.


(dele herdei uma covinha no queixo, o silêncio e a contemplação, a pacata impulsividade e sociabilidade, o gosto pelo cuidar das coisas, a tudo perdoar)

9 comentários:

João Roque disse...

Evocação muito bela de uma pessoa fabulosa, que penso seja teu Pai (perdoa-me se estou a ir por caminhos que não devo...)!
Quem quer que tivesse sido, deves sentir orgulho e bem legitimado.
Só uma pequena observação: quando estudei no então Liceu de Castelo Bramco,em 1960/1 tive um colega que era de Salvaterra do Extremo...
Abraço.

Special K disse...

Nem sonhava que existia uma terra chamada Salvaterra do Extremo. Já tinha lido num comentário por aí que o teu pai era padre não foi sem um toque de emoção que no fim deste post percebi que estavas a falar dele.
Uma excelente homenagem.
Um abraço.

TUSB disse...

Que linda homenagem, só prova que ainda há Amor na religião!!!
Obrigado por partilhares!

Moi disse...

Não, Pinguim, tens toda a razão. Para além do orgulho da costela beirã e da história de vida do meu pai, guardo boas imagens dessa aldeia raiana que já foi vila...

É também com emoção que o faço, K, pois de todo ele eu aprendi (genes ou não)até à sua morte. Hoje faria 81 anos.

É bem verdade que as bases das religiões são puras, as hierarquias é que estragam submetendo-as a normas doutrinárias para sujeitar as vontades indivduais. Abraço, Unfurry

Agradeço a todos as palavras, a lembrança (e o que vos traz e faz pensar). Até já

Paulo disse...

O teu pai há-de ter sido uma pessoa extraordinariamente boa.
Não consigo dizer mais nada; embargaram-se-me os dedos.

ding ling disse...

Um beijo.

Socrates daSilva disse...

Uma história assim deve ser partilhada. Para que se continue a acreditar no que de bom existe nas pessoas á nossa volta.
Abraço

ZOT disse...

Obrigada pela bela emoção...

Mi disse...

Adorei... Simpelsmente lindo.
Um beijo e um abraço muito apertado

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